Já olhou uma borboleta de perto? Já observou seu processo de transformação, ou, mais precisamente, de metamorfose? Inspirada por essa transição radical, a artista Carla Zaccagnini propôs uma obra que traça um paralelo entre as mudanças das borboletas e as transformações da cidade de São Paulo ao longo do século XX. A comparação ressalta a transição de um vilarejo a uma metrópole, refletindo também as contínuas mudanças na Vila Itororó.

A Metáfora da Metamorfose

As presenças de larvas, casulos e borboletas na obra de Zaccagnini tornam tangíveis, em uma escala de tempo e espaço diferente, as transformações violentas que também caracterizam a Vila. Entre utopia e fracasso, sonho e frustração, construções e destruições, rios enterrados e moradores desalojados, os ciclos naturais das borboletas se entrelaçam com as narrativas humanas da Vila, criando uma experiência vertiginosa do tempo.

O Efeito Borboleta

A teoria do Caos sugere que o bater de asas de uma borboleta em um lugar pode gerar uma tempestade em outro. O que dizer então do bater de asas de uma panapanã, coletivos formados pelas borboletas durante suas migrações? Este conceito é explorado na obra de Zaccagnini, que propõe que, por mais singelo que pareça, criar borboletas em um canteiro marcado por tantas histórias pode ser uma forma inesperada de reafirmar nossa capacidade de influenciar, e talvez mudar, o rumo de uma história frequentemente determinada por interesses destrutivos.

A Obra em Múltiplas Camadas

A obra de Zaccagnini, composta por um borboletário, um audioguia e uma publicação, adentra as diversas narrativas da Vila Itororó. A transformação da Vila é refletida através do ciclo de vida das borboletas, simbolizando esperança e renovação. A instalação convida os visitantes a se envolverem ativamente no processo de transformação.

O Mutirão de Plantio

O início dos trabalhos foi marcado por um mutirão de plantio, coordenado pela bióloga Paulina Arce. Carla, junto com a arquiteta Keila Costa, projetou doze canteiros que receberam plantas hospedeiras e alimentadoras para as borboletas. Após o plantio, uma refeição foi preparada por Ingrid Cuestas, do laboratório itinerante de cozinha Sol de Noite, que utiliza a comida como espaço de encontro e criação coletiva. Este momento foi uma oportunidade para ouvir histórias da Vila, gravadas em formato de audioguia.

A Obra em Construção

Como tudo na Vila Itororó Canteiro Aberto, a obra de Zaccagnini continua em construção. À medida que as plantas crescem e atraem mais borboletas e pessoas, novas histórias serão acrescentadas pela artista. Uma publicação registrando todo o processo será lançada em breve, documentando as diversas camadas de transformação da Vila.

Conclusão

A metamorfose das borboletas e as mudanças da Vila Itororó servem como uma poderosa metáfora para a capacidade de transformação urbana e social. A obra de Carla Zaccagnini não só celebra essa capacidade, mas também convida a comunidade a participar ativamente no processo, criando uma narrativa coletiva e dinâmica que reflete as complexidades e esperanças da vida urbana.

Benjamin Seroussi, curador

Obs: “Panapanã” vem de panãma, “borboleta” em tupi. Dessa forma resultou a palavra “panamá” (que Houaiss também registra como sinônimo tanto de borboleta quanto de panapanã). Da perda da última sílaba e da duplicação do termo (“panã-panã“), resultou a forma “panapanã”, que gerou também a variante panapaná”.